22 de mar. de 2010

Emoção, força e docilidade em "As chaves de casa"

Delicadeza é a principal carcterística e também a maior qualidade de "As chaves de casa", do italiano Gianni Amelio. O cineasta é responsável por levar a plateia às lágrimas sem lançar mão de um pingo de sentimentalismo. Ele conta apenas com a emoção que, por si só, a história que deseja contar desperta. O longa acompanha uma jornada dolorida de um homem (Kim Rossi Stuart), que decide finalmente se aproximar do filho de 15 anos, com quem nunca teve muito contato. Acontece que o garoto tem uma deficiência que faz com que ele tenha que ir, anualmente, até Berlim, onde faz sua terapia.

Essa acaba sendo a deixa para que o pai estreite seus laços com o menino, já que ele decide acompanhá-lo na sua próxima viagem à capital alemã. Está dada a premissa de um drama forte, que é muito mais impactante do que sua breve sinpose possa fazer parecer. Amelio tem uma ótima mão para conduzir as interpretações e desviá-las da pieguice. Ele se utiliza de muita ternura para extrair de todo o elenco uma sinceridade comovente. Kim Rossi Stuart demonstra todo o seu talento na pele de um pai culpado que passa a experimentar as dores e as delícias de se ter um filho. No caso de seu personagem, as dores são muito maiores que as delícias, já que ele tem de lidar com constantes avanços e reveses vividos pelo jovem Paolo.
Depois que chega ao hospital no qual o filho passa pelo tratamento, Gianni, o pai conhece Nicole, uma mulher que tem um filha também deficiente. Em alguns minutos de conversa com ela, é confrontado com a dura verdade que permeia a vida de quem precisa acompanhar a rotina de um eterno paciente em suas limitações. A mãe resignada e incansável é defendida com propriedade pela talentosa Charlotte Rampling, atriz dotada de uma versatilidade admirável. Ela transita muito bem entre o italiano, o francês e o alemão através de sua personagem, que ab funcionando como uma ponte para a entrada de um pai hesitante num universo desconhecido e inesperado. Ele vai aprendendo dia após dia a vencer muitas etapas importantes, sem ter a certeza de que amanhã será melhor do que hoje.

É nessa abordagem que se equilibra bem entre o emocional e o prático que reside a relevância de "As chaves de casa". O diretor nunca permite qe Paolo desperte o sentimento de comiseração no espectador. Ele tem, sim, um grande problema, mas consegue trazer alegria a Gianni a cada nova conquista, e se mostra muito mais ciente do mundo ao seu redor do que faz seu pai imaginar. Isso também conta a favor de Amelio, porque faz com que seu filme não soe panfletário. Antes de tudo, trata-se de um conto sobre as infinitas possibilidades da vida, e sobre a necessidade que todos temos de ajudar e ser ajudados pelas pessoas que estão à nossa volta. Gianni, em sua decisão de ficar mais perto de Paolo, percebe a importância de se reinventar, adequando-se à nova situação que começa a viver. A transformação do personagem em prol do filho é tocante, e leva reflexões intensas acerca das relações paternais. Mais do que isso, remete ao pensamento sobre como os seres humanos estão se relacionando uns com os outros atualmente. Num mundo cujo contato pessoal está cada vez mais escasso, e todos estão cada dia mais virtualizados e cibernéticos, uma discussão a respeito do tema tem relevância máxima. Por todas essas características, "As chaves de casa" não é um filme que se deva deixar passar despercebido. Ele prova que o cinema italiano ainda rende exclentes histórias, e faz com que lindas experiências possam ser compartilhadas.

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