Ano após ano, o amor é objeto central de inúmeros filmes, de nacionalidades diversas. A cada nova aparição, assume um nova (ou renovada) faceta, mas nem sempre dissecada com a devida habilidade. No filme de Marc Webb, contudo, o resultado é bastante acima do satisfatório. Trata-se de uma comédia de tintas dramáticas - ou seria ou drama de tintas cômicas? - sobre as infinitas possibilidades de se viver um amor. Sentimento que muitos hoje condenam a evanescência, é ele que move o cotidiano de Tom (Joseph Gordon-Levitt) a partir do dia em que conhece Summer (Zooey Deschanel), uma garota que vira sua cabeça rapidamente. O nome da jovem é um trocadilho perfeito com a estação mais solar do ano, que simboliza a chegada da luz e da cor para todos. Mas não é bem assim que acontece para Tom.
Em pouco tempo, o rapaz se vê perdidamente apaixonado pela garota, enquanto ela nem pensa em assumir compromisso sério com ninguém nessa vida. Tom acha que essa concepção de Summer sobre relacionamentos pode mudar a qualquer momento, mas não tem coragem de assumir logo a paixão que sente. O filme conta toda a história de amor (?) entre os dois de maneira retroativa, mostrando ao espectador que todo o imbróglio vivido pelo protagonista se arrastou por quinhentos dias, como também informa o título. Mas nada é mostrado dentro a ordem cronológica, o que acaba se tornando um doas grandes achados da trama, que acompanha todas as alterções sofridas por Tom desde o dia em que conhece Summer. Em uma cena, pode-se estar vendo o 287º dia do relacionamento deles, e na sequência seguinte surge o 63º dia, no qual eles ainda não são mais do que bons amigos. É um recurso que injeta dinamismo na história e dá várias rasteiras na obviedade, já que nunca se sabe de qual momento da vida em comum que eles passam a ter Tom se lembrará. Aliás, tudo o que se vê na tela são as lembranças do rapaz a respeito dela, sendo vistas sob a sua perspectiva. Não por acaso, o espectador acaba logo se tornando cúmplice do portagonista, e enxergando as situações apresentadas como ele.
"(500) dias com ela" ainda tem outros diferenciais em relação à maioria das comédias românticas que aportam nos cinemas ano a ano. O próprio rótulo de comédia romântica é limitador, pois Webb vai muito além de qualquer fórmula, apresentando uma história completamente verossímel e a milhas de distância de qualquer chavão presente em outros exemplares do gênero. A escalação de Joseph Gordon-Levitt é um exemplo. O ator não é um modelo de beleza do qual se alimentam as comédias, o que o faz de seu T
om um garoto que pode ser qualquer um de nós. E Summer, apesar de linda, parece-se com qualquer garota de coração gélido que nos despedaça por sua inatingibilidade quando ainda somos meninos sonhadores. Sua convicção prática sobre as relações amorosas são baldes de água fria que ela joga o tempo todo no pobre Tom. Mas, antes que se pense que Webb se utiliza de misoginia, o retrato de Summer é bastante gracioso. Cruéis são suas atitudes.
Outro detalhe curioso o longa é a sequência em que Tom vai a uma festa para a qual Summer o convidou. Na hora em que ele chega ao apartamento dela, a tela é dividida em dois. De um lado, estão as expectativas dele em relação a um encontro tão importante. Do outro, a dura realidade que se lhe apresenta na ocasião. Os acontecimentos de sua expectativa são muito mais interessantes que aqueles que a realidade lhe oferece, e a noite termina da pior maneira possível. Esse truque de justapor dois ângulos opostos de uma mesma situação é verdadeiramente mais uma bela sacada dos roteiristas. A visão de Tom muda também de um dia para o outro. Se primeiro ele enxerga Summer como uma mulher perfeita e ideal, tempos depois ele se irrita com tudo que antes admirava nela. Bastante parecido com a fúria que toma conta de alguns ex-amantes. Até mesmo uma pinta, que ele primeiro vê como um sinal charmoso na garota, depois passa a ser como un incômodo carrapato, tamanho seu despeito por não tê-la. Ou seria uma certa raiva de si mesmo por não conseguir deixar de amá-la? O juízo fica a cargo do público.
A trilha sonora encantadora é outra ótima razão para se assistir a "(500) dias com ela". Repleta de canções que versam sobre o amor, cada uma à sua maneira, elas são o arremate perfeito para uma trama muito bem construída, com suas idas e vindas, fruto de uma narrativa que acompanha a mente, nem sempre tão ordenada em suas lembranças. Esse filme vem se somar a outras excelentes produções contemporâneas que retratam o amor para além de maniqueísmos, como é o caso de "Amor em cinco tempos", "Brilho eterno de uma mente sem lembranças" e "Canções de amor". Todos eles, e mais alguns outros, trouxeram belas contribuições para que se descubram novos olhares sobre esse tema tão pertinente que é o amor. Os diretores desses longas apresentam um amor que se vive no dia a dia, longe das idealizações e dos previsíveis finais felizes que pertencem a uma realidade paralela, só encontrada nas telas do cinema. Marc Webb vem se juntar a essa estirpe de realizadores com muito mais a dizer, calcados num conteúdo trabalhado com maior elaboração. Essa elaboração vem do acerto no ritmo, nas atuações, nos diálogos e em tantos outros fatores que fazem de "(500) dias com ela" uma pequena obra-prima.
15 de mar. de 2010
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