16 de jul. de 2009

A realidade nua e crua de "A criança"

Para quem não conhece o cinema praticado pelos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, algumas apresentações podem ser interessantes. A dupla de cineastas belgas é conhecida por dirigir filmes com alta dose de realismo, calcada numa narrativa seca e quase documental, aproximando bastante o espectador do objeto que eles se propõem a retratar.
É exatamente o que se passa com "A criança", filme com o qual os Dardenne ganharam mais uma Palma de Ouro no Festival de Cannes. A anterior havia sido por "Rosetta", em 1999.
Aqui, eles trazem mais uma vez seu realismo típico para contar a história de Bruno e Sonia, vividos por Jérémie Renier e Débora François. Eles são muito jovens e acabaram de ter um filho juntos.
Mas o nascimento dessa criança é encarada de maneira diferente por cada um dos dois. Enquanto Sonia aproveita a chegada, ainda que não planejada, do filho, para amdurecer e ampliar os horizontes de sua vida, Bruno só enxerga no menino uma maneira de aplicar pequenos golpes para sobreviver. Ele tem num adolescente de menos de 15 anos um parceiro para suas trapaças.
Essa disparidade de perspectivas gera inúmeros conflitos para o casal, que se vê cada vez mais dividido, rumando para caminhos opostos. Nesse momento do filme, cenas bastante bonitas são dadas de presente ao espectador pelos irmãos Dardenne. Fica claro que Bruno é um rapaz imaturo, tão desamparado quanto o filho do qual acaba de se tornar pai. Com apenas 20 anos, ele também carece de alento e de atenção, como uma criança que não mede as consquências de seus atos irresponsáveis.
Há uma sequência na qual ele e seu comparsa fogem de um grupo de delinquentes que quer acertar contas com eles, e acaba se refugiando num rio, passando por um frio intenso e quase adoecendo.
Enquanto isso, Sonia tenta seguir em frente, amadurecendo e procurando um emprego para arcar com as despesas de criar um filho que não era esperado para agora. A maneira como é mostrada a tentativa de cresciemento da personagem é de uma realidade brutal. Como contadores de histórias, Jean-Pierre e Luc não estão interessados em fazer julgamentos morais sobre seus personagens, mas apenas em espiá-los e descobrir como eles se sairão nas mais diversas vicissitudes que a vida lhes impõe dia após dia.
Nada para o casal é fácil e, desse modo, o filme pode incomodar pela crueza com a qual a vida deles é mostrada. Mas "A criança" é um filme de uma coragem admirável.
Um dado curioso acerca dos bastidores do longa é que a criança do título foi "interpretada" por 20 bebês diferentes ao longo das filmagens. Ela era constantemente trocada pela produção do filme, mas o fato passa despercebido para quem assiste a ele.
No mais, é se preparar para acompanhar a trajetória complicada de dois indivíduos tentando achar seu lugar no mundo, mesmo aos trancos e barrancos. Por vias distintas, o que os dois querem, no fundo, é a mesma coisa. Descobrirem que são e até onde podem ir. Questionamentos de todos nós, sem sombra de dúvida.

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