4 de jul. de 2009

O questionamento da vida em "As horas"









São raros os filmes que dizem tanto com tão pouco, mas certamente esse é o caso de "As horas", segundo filme do diretor Stephen Daldry (Billy Elliot), que mostra mais uma vez talento e desenvoltura atrás das câmeras.

Aqui, ele reúne um elenco maravilhoso para um projeto ousado. O filme é calcado numa narrativa tríptica, para a qual é exigida atenção constante do espectador. Logo de início, somos envolvidos pela atmosfera algo soturna da personalidade de Virginia Woolf (Nicole Kidman), escritora inglesa cuja obra final, "Sra. Dalloway" irá influenciar uma dona de casa nos anos 50, a frágil Laura Brown (Julianne Moore, fantástica) e se "concretizar" nos dias atuais, através da vida de Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora de livros que, como as outras mulheres, está atravessando uma crise existencial.
Cada uma das três está vivendo também uma fase de questionamentos, o que gera várias passagens de silêncios, que são reflexões internas das personagens. Toda a ação do filme se passa em um único dia, que é o que acontece também no livro que Virginia está escrevendo.
Vamos ao drama específico de cada uma delas.
Virginia está à volta com um tratamento que rejeita contra sua insanidade. Ela vem ouvindo vozes, o que a faz ficar profundamente perturbada. Inveja a vida da irmã que, por sua vez, a acha uma mulher de sorte, pois tem duas vidas: a dela e a do livro que está escrevendo. Mas Virginia deseja uma outra vida. Cabe ressaltar aqui o excelente trabalho de composição de Nicole Kidman, enfeada por uma prótese no nariz e muita maquiagem. É clichê, mas é necessário dizer que ela "desaparece" na personagem.
Laura vive um casamento que não é como ela desejava. Tem um filho pequeno e está grávida do segundo. Deseja viver uma outra vida também. Sua vizinha Kitty (Toni Collette) a considera uma bem-aventurada porque, ao contrário dela, que tem um problema no útero, Laura pode engravidar. Laura decide tomar uma atitude radical em sua vida, mas algo a impede.
Finalmente, Clarissa está preparando uma festa para comemorar o prêmio de poesia conquistado por seu grande amigo Richard (Ed Harris), que acabou de se assumir portador do vírus da AIDS. Para ele, foi apenas sua doença que lhe possibilitou levar o prêmio. Em dado momento do filme, Clarissa extravasa sua crise interior num diálogo tenso com Louis (Jeff Daniels), que teve um romance com Richard no passado. É uma das passagens mais marcantes do filme.
A questão central de "As horas", que perpassa todos os núcleos da história. é do conformismo x inovação. Há um desejo enorme nessas mulhesres de trilhar o caminho que bem entenderem, sem necessariamente estarem presas às amarras das convenções. O modo como Daldry expõe as tramas também contribui para que o filme se torne bastante reflexivo.
Pode até não levar às lágrimas, mas certamente é um filme capaz de inquietar, de fazer questionar quem somos e o que estamos fazendo dos dias que no foram dados para estar sobre a terra: nossas vidas. É, antes de qualquer coisa, um filme sobre mim, sobre você e sobre todos nós.

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