2 de jul. de 2010

"A era do rádio", uma singular homenagem a certos áureos tempos

A década de 40 foi um período extremamente charmoso para o mundo, principalmente na Europa e nos Estados Unidos. E Woody Allen não se esquivou de apresentar seu retrato dessa época. O resultado pode ser conferido em "A era do rádio", filmado por ele em 1987. É mais um filme divertido e com marcas registradas do cineasta que fez de Nova York sua personagem mais famosa. No filme, ele prossegue com sua parceria com Mia Farrow, com quem havia rodado sucessos como "Zelig" (1983) e "A rosa púrpura do Cairo" (1985). E, mais uma vez, deixa de acumular a função de ator, preferindo a direção e a narração da história que tem a contar dessa vez.

O filme se centra em uma série de episódios acerca de uma família novaiorquina que tem seu cotidiano marcado pelo rádio, a invenção mais revolucionária entre os meios de comunicação daquele tempo. Toda a ação do longa é voltada para uma aura de idealização que toca o espectador desde as primeiras cenas. Não há protagonistas absolutos, mas o pequeno Joe Needleman, um menino de apenas 10 anos de idade, é um dos personagens mais cruciais da narrativa. Interpretado por Seth Green, que depois viria a fazer muitos outros filmes, como "Os queridinhos da América" (2001) e "Uma saída de mestre" (2003), ele é fascinado pelas histórias incríveis que escuta nos noticiários do rádio, e também em programas sensacionalistas típicos daquela fase e que, ainda hoje são uma praga difícil de ser exterminada. Ele também se encanta com o que hove sobre belas mulheres, que acabam povoando seus sonhos de garoto em fase pré-adolescente.
Joe é apenas um dos tipos de uma vasta galeria oferecida por Allen, que traz uma família com membros de toda natureza. Atualmente, empregá-los é cair no lugar-comum, mas Allen os utilizou primeiramente com grande originalidade e frescor. São muitos os destques no elenco de veteranos, como a tia insaciável e solteirona vivida por Dianne Wiest, que arranca muitas risadas com suas aventuras amorosas sempre frustradas. E também o pai austero e convincentemento censor interpretado por Michael Tucker, que mantém um caso com uma charmosa vendedora doces, Sally (Farrow). Com esse e outros personagens cativantes, "A era do rádio", evoca um pouco dos filmes de Fellini, que sabia tocar em temas como o crescimento de um indivíduo e a memória como poucos faziam.

A direção afiada de Woody Allen contribui para que o filme figure entre os seus melhores, mesmo que não apresente muitas novidades entre o que ele filmara antes ou filmaria posteriormente. É uma delícia acompanhar a desventuras de Joe e de seu clã, que são narradas com sarcasmo pelo próprio diretor, exercitando novamente sua veia bem-humorada. Ao longo dos enxutos 85 minutos de projeção, desfilam pela tela personagens memoráveis como Biff Baxter (Jeff Daniels) - curiosamente, seu personagem tem o mesmo sobrenome do que ele viveu em "A rosa púrpura do Cairo" e o cantor de rádio de William H. Macy, que surge em uma das noites de show do clube onde Sally trabalha.
Resumindo, o estilo inconfundível de Woody Allen, que tem talento de sobra para conduzir tramas temperadas com o melhor da ironia e da inteligência é o maior atrativo de "A era do rádio", que se encaixa entre os grandes sucessos da década de 80 na carreira do diretor, e que trazuma bela homenagem a um tempo que já não existe mais, cheio de glamour e emoção. Por meio de seus personagens cativantes e adoráveis, emerge uma nostalgia apaixonante, que enreda o público numa trama doce e inofensiva. Hoje, sabe-se de antemão que carreiras de sucesso como as mostradas no filme conheceriam a decadência, mas o que se guarda na memória são apenas os áureos tempos.

Nenhum comentário: