Na esteira de filmes que falam sobre os anos desconcertantes do regime político que cindiu a Alemanha por longas décadas no século XX, "A vida dos outros" merece, com louvor, um lugar de destaque entre as obras mais relevantes sobre o assunto, que já foi abordado por diferentes perspectivas e por realizadores das mais variadas estirpes.
No filme em questão, cabe a um diretor estreante dar conta de lançar seu olhar sobre um momento dessa era nebulosa. E ele é Florian Henckel von Donnesmarck, capaz do feito de entregar um filme indispensável passado na Alemanha nazista.
A câmera do cineasta acompanha, pacientemente, os passos de um casal de artistas que vive nesse ambiente em que qualquer desvio de uma norma extremamente coecirtiva é classificado com subversão. Ele é o dramaturgo Georg. Ela é a atriz Christa-Maria. Suas ações vêm levantando a suspeita de que há algo de errado com eles, o que leva um capitão em busca de ascensão na carreira a escalar um agente para acompanhar a rotina dos artistas, passo a passo. Com isso, qualquer passo em falso dado por eles terá, imediatamente, sua punicão devida.
Gerd, o agente, passa a ser somente olhos e ouvidos, em seu cotidiano de atenção constante sobre Georg e Christa-Maria. Sua vida passa a ser a vida levada pelos dois, sem que ele se dê conta disso. É impressionante notar a crueldade de um sistema que leva o desejo de uniformidade e obediência cega até as últimas consequências, trazendo resultados amargos para todos os envolvidos. A impressão de um cenário altamente opressor é sublinhada pela utilização de uma fotografia algo acinzentada, e pela opacidade da luz que atravessa várias cenas.
Além desses elementos, a direção segura de Donnersmarck também conta bastante a favor de "A vida dos outros", e os atores, com suas inspiradas interpretações, reforçam essa tese. O trio de nomes centrais que se vê na tela dá tudo de si, gerando cenas memoráveis. Ulrich Mühe está perfeito na pele do agente que, de tanto acompanhar tudo o que se passa com o casal que está espionando, desenvolve uma clara afeição por eles, que se preocupa em esconder o tempo todo. Mas essa afeição também o leva a passar por cima de códigos e protocolos e tomar uma atitude inesperada, que interfere na vida dos artistas, lá quase pelo final do filme.
No mais, "A vida dos outros" é um filme ao qual se deve assistir com atenção acurada, para que se evite perdas importantes, na narrativa, que sofre reviravoltas em algumas passagens. Esse é um retrato reflexivo de como um regime cruel interferiu negativamente nas vidas de pessoas absolutamente comuns, que apenas viviam.
18 de jan. de 2010
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