O sabor de se assistir a um filme bem realizado é um dos mais imprescindíveis. A cada ano que passa, com a necessidade crescente de renovação e a descartabilidade que acometem os seres humanos, encontrar uma história que cative e entretenha sem abrir mão da inteligência se torna mais difícil.
Por isso, "Juno" deve ser saudado como um exemplar contemporâneo dos filmes elegantemente bem dirigidos e com atores em ponto de bala para oferecer ao espectador o melhor em termos de cenas inesquecíveis e enredo que prende a atenção.
O segundo filme de Jason Reitman (do não menos inteligente "Obrigado por fumar") flagra o cotidiano de Juno MacGuff (Ellen Page), uma esperta adolesecente que sabe muito bem o que não quer da vida, mas o que quer... Numa tarde de tédio, decide fazer sexo com o namoradinho de ocasião, e desse ato inconsequente, surge - surpresa! - uma gravidez indesejada. A partir de então, a jovem terá de lidar com a realidade desagradável, para ela, de carregar um filho na barriga pelos próximos nove meses.
De seu inconformismo com a nova situação surge a ideia um tanto inesperada para pôr fim ao seu "problema": entregar a criança que ainda nem nasceu para adoção. Com a ajuda da melhor amiga, decide dar cabo de seu plano mirabolante. Procura nos jornais um casal interessado em adotar um filho, e encontra depois de muito buscar aquele que parece ser o par perfeito para que ela dê o bebê. Entram em cena, para ficar com a criança, os simpáticos Vanessa e Mark, dois trintões tranquilos que não veem a hora de ser pais do filho que Juno espera.
Porém, nada é tão fácil como pode parecer, e são as complicações - ingredientes indispensáveis em um filme que se preze - que reservam os momentos de ápice do longa. Mark, que a princípio parece encantado com a ideia de ser pai, aos poucos vai demonstrando que, talvez, ainda não esteja totalmente pronto para a nova condição. Fica a impressão de que o mais interessante para ele seja continuar por mais um tempo em meio aos instrumentos musicais dedilhando canções algo melancólicas. Seu comportamento evidencia pouca maturidade, como o verdadeira pai da criança, o desengonçado Paulie Bleeker (Michael Cera, um jovem talento). Ambos são polos correspondentes na trajetória tortuosa percorrida por Juno. O desejo de acertar no que fazem também é um ponto de intersecção entre os dois personagens. Esse despreparo logo incomoda Vanessa e aproxima Mark de Juno, gerando uma química bastante amigável entre os dois, antes de qualquer coisa.
Vale destacar que uma das características que a personagem-título tem de melhor é seu sarcasmo, traduzido em tiradas de humor fino e arguto. Responsabilidade de Diablo Cody, ex-stripper que ganhou o Oscar de roteiro original pelo filme e causou frenesi por isso. Sem deixar que a ação resvale para o sentimentalismo ou para a baboseira, ela encontrou o equilíbrio perfeito entre uma narrativa bem construída e um entretenimento para jovens. Nem sempre essa alquimia é obtida, ponto para Diablo.
As cenas são, em sua maioria, de uma leveza e graça encantadoras, e os coadjuvantes também dão conta do recado, como é o caso de J.K. Simmons e Allison Janney, respectivamente o pai e a madrasta de Juno. Apesar das aparições relativamente curtas em cena, ambos agradam, e muito pela maneira como inserem suas opinões valiosas sobre o desdobrar dos acontecimentos. Golpe de mestre de Reitman, que já mostrou a que veio com um filmografia ainda curta, mas relevante. No meio da enxurrada de novos diretores que toma de assalto a Hollywood ano após ano, nem sempre é tarefa fácil distinguir quem vale mesmo a pena de quem só tem a apresentar uma coleção de incipiências.
A cena final, com os protagonistas tocando violão, é de uma simplicidade notável, e de um realismo igualmente visível. Coroa o esforço e a dedicação de todos os envolvidos de trazer ao público uma trama à qual se deve realmente assistir, provando que ainda se faz bom cinema na contemporaneidade. Decreta-se, assim, que juvenil, definitivamente, não rima com imbecil.
2 de jan. de 2010
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