20 de jan. de 2010

"Amor em cinco tempos": a finitude dos sentimentos

Entre os diretores mais celebrados do cinema francês atual, está Frnaçois Ozon, um jovem realizador inventivo e interessado em perscrutar as chagas da vontade humana sob diferentes vieses. A cada filme, sua câmera observa o outro de um ângulo ora cômico, ora semitrágico, resultando em obras poéticas e desprovidas de qualquer traço de banalidade. Seu discurso aparentemente superficial encobre um espectador atento da natureza do homem. Juntamente com Woody Allen, seu polo aproximante na cinematografia americana, Ozon produz quase um filme por ano, e flagra costumes e ideologias com a argúcia de um bom conhecedor das mazelas de cada um de nós.
Toda essa introdução serve para pontuar sua importância no cenário artístico atual, em que pese sua não unanimidade entre os críticos. Mas esse já é um outro detalhe não tão pertinente... Christophe Honoré, um de seus compatriotas e contemporâneos, não goza de melhor prestígio, embora seja igualmente talentoso.

Em "Amor em cinco tempos", filme de título autoexplicativo, o grande achado é lidar com as perdas e ganhos de um casal pelo prisma da não-linearidade. O tema não poderia ser mais universal e de fácil identificação, o que é uma das explicacações para que o longa tenha o espectador nas mãos em poucos minutos de história. Todavia, evidentemente, isso não é o bastante. O argumento não é trabalhado de forma frágil, trazendo à tona um enredo que desperta vero interesse. Captam-se cinco momentos na vida de um casal absolutamente comum, Gilles (Stéphanie Freiss) e Marion (Valeria Bruni-Tedeschi, um oásis de beleza e competência), do dia do seu divórcio à ocasião em que se conheceram, numa praia.
Toda a trajetória dos amantes é delineada a partir desses cinco fragmentos, bem articulados, que evidenciam para o público o verdadeiro modo de ser e de agir de cada um. Logo, precebe-se que neste jogo de azar que é uma relação a dois nunca há culpados ou inocentes. Ambos os lados têm sua parcela de responsabilidade no sucesso ou no fracasso da união. É um afirmativa trivial e óbvia, mas que, esquecida no decurso de um namoro ou casamento, reclama sua evidência permanente.

O recurso empregado por Ozon, contar uma história de trás para a frente, não é novo. Em "Irreversível", Gaspar Noé já havia lançado mão desse mesmo expediente, apenas dois anos antes. Mas, se no filme protagonizado por Monica Belucci e Vincent Cassel o mote era o impacto de cenas difíceis de se esquecer, em "Amor em cinco tempos" a sua utilidade é um pouco diferente. Com o presente sempre antes do passado, torna-se notório que qualquer julgamento que se faz a respeito de um dos personagens, ou dos dois, pode ser totalmente equivocado. Só se descobre o que levou a cada atitude de Gilles ou de Marion depois que o segmento seguinte - na verdade, o anterior - é apresentado.
O truque, por si só, contudo, não é a única razão de relevância do filme. Mas também suaa honestidade em mostrar um homem e uma mulher como quaisquer outros, depidos de idealizações parvas que mascaram defeitos e imperfeições. A certa altura do filme, o espectador pode criar um torcida por ele, por ela ou pelos dois, devido a uma forte identificação com sua história.
Também conta pontos positivos para o filme sua trilha sonora, com canções italianas, belas de doer. Elas ajudam a demarcar pontos cruciais da jornada de Gilles e Marion, que, entre um começo e um término oficiais, passam, também, pela gangorra das idas e vindas. Na cena em que Gilles tenta possuir Marion à força, fulgura um misto de amor recolhido com orgulho próprio abalado, sem que se saiba ao certo o que é cada sentimento. Certo, mesmo, é que sentimentos pouco arraigados sempre acabam.
Com o final anunciado logo na primeira sequência, não se pode afirmar que acompanhar o desfecho de um casal desfeito seja motivo para se assistir ao filme. Nada disso. Interessa, sim, entender e descobrir como tudo começou, e os sinais de que nada ia tão bem desde muito antes do fim de tudo. Afinal, o amor não acaba abruptamente, mas dá pistas, ainda que inexatas, de que está se esvaindo, seja em gestos, seja em olhares, seja em palavras que atravessam os momentos a dois. E Ozon demonstra essa crença com a habilidade de um poeta das incongruências de um casal.

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